27 de setembro de 2016

TST: Acordo coletivo de horas in itinere sem contrapartida é inválido


O Pleno do TST julgou na tarde desta segunda-feira, 26, a validade de acordo coletivo de trabalho sobre horas in itinere.

Na sessão anterior, o relator, ministro Augusto Cesar, negou provimento aos embargos com base em seis fundamentos:

1 – A autonomia negocial coletiva não é absoluta.
2 – A autonomia negocial absoluta não altera a natureza jurídica das parcelas.
3 – Os precedentes do STF comportam a técnica do “distinguishing” e não incidem no caso concreto.
4 – A jornada é direito indisponível pelo princípio da dignidade da pessoa humana.
5 – A jornada é direito indisponível pelos princípios da saúde e da segurança.
6 – A flexibilização das horas se fez sem a correspondente vantagem indenizatória.

No resultado do julgamento, prevaleceram como majoritárias as seguintes teses.

1 – A autonomia negocial coletiva não é absoluta.
3 – Os precedentes do STF sobre a matéria comportam a técnica do “distinguishing” para não incidência dos precedentes no caso concreto.

A votação final das teses, de um colegiado de 26 ministros, foi: Tese 1 – 19 votos / Tese 2 – 12 votos / Tese 3 – 19 votos / Tese 4 – 11 votos / Tese 5 – 10 votos /Tese 6 – 13 votos.

Assim, negou-se provimento aos embargos, ficando vencidos os ministros Ives Gandra (presidente), Maria Cristina Peduzzi, Barros Levenhagen e Dora Maria da costa, que consideraram a cláusula em análise válida.

Precedentes do STF

Os dois precedentes que foram analisados pelos ministros do TST são o RE 590.415, julgado pelo plenário como recurso repetitivo, e o RE 895.759, que teve decisão monocrática do ministro Teori.

No caso do plenário, relator ministro Barroso, ficou assentada a seguinte tese: “A transação extrajudicial que importa rescisão do contrato de trabalho em razão de adesão voluntária do empregado a plano de dispensa incentivada enseja quitação ampla e irrestrita de todas as parcelas objeto do contrato de emprego caso essa condição tenha constado expressamente do acordo coletivo do plano e demais instrumentos celebrados com o empregado.”

Já no caso julgado monocraticamente, o ministro Teori deu provimento a recurso para afastar a condenação de uma empresa ao pagamento das horasin itinere e dos respectivos reflexos salariais, considerando: “Ainda que o acordo coletivo de trabalho tenha afastado direito assegurado aos trabalhadores pela CLT, concedeu-lhe outras vantagens com vistas a compensar essa supressão. Ademais, a validade da votação da Assembleia Geral que deliberou pela celebração do acordo coletivo de trabalho não foi rechaçada nesta demanda, razão pela qual se deve presumir legítima a manifestação de vontade proferida pela entidade sindical.”

Julgamento

Na sessão da semana passada, o ministro Oreste Dalazen seguiu o relator, com base nos fundamentos de nº 1 e nº 3, e o presidente Ives Gandra da Silva Martins Filho inaugurou a divergência para dar provimento e reconhecer a validade de cláusula de acordo coletiva de horas in itinere. A ministra Peduzzi adiantou o voto acompanhando a divergência.

A sessão foi retomada com o longo voto do ministro José Roberto Freire Pimenta, que iniciou destacando a importância do julgado:

Está em jogo a própria amplitude das negociações coletivas de trabalho no pais diante dos direitos da Constituição e das leis. Em jogo o principio da prevalência do negociado sobre o legislado. A jurisprudência pacífica era invalidar esse tipo de renúncia. Esse caso se torna difícil pela ampliação da discussão que se promove, uma amplitude em que data vênia ele não teria em princípio.”

O ministro destacou que o caso é diferente do que foi julgado em repetitivo pelo STF, de relatoria do ministro Barroso, pois lá era uma adesão a PDV em caso de privatização do banco, em que a própria classe se mobilizou para forçar o acordo. E ainda declarou:

Não negamos a validade do acordo, e sim a parte que diz que além de fixar uma hora, quando seriam duas, entende que não haveria a incidência de IR, contribuições, férias, 13º. Essa parte da cláusula que o Regional invalidou e nós mantivemos. Tratou-se de pura e simples renúncia. Se o salário está tendo sua base de cálculo artificialmente alterada para valor menor e atribuindo natureza indenizatória, me parece que um direito fundamental dos trabalhadores, consagrado no artigo 7º da CLT, está sendo afastado por norma coletiva de trabalho. Seria o mesmo que dizer que o salário mínimo não será pago.”

Uma negociação coletiva no Brasil, no momento de fragilidade dos sindicatos, em que a maioria conta com nível de sindicalização baixo, e se está propondo que assembleias de 200 trabalhadores possam ser capazes de abrir mão de direitos de milhares de trabalhadores. Se essa proposta vingasse o efeito seria devastador para o conjunto de direitos trabalhistas assegurados na Constituição e nas leis. Uma ou outra poderia ser bem sucedida, mas o conjunto seria prejudicial.”

Esse princípio da prevalência do negociado sobre o legislado talvez pode ser alcançado pela via legislativa. O presidente FHC tentou e não teve sucesso. Se há instância que deve se debruçar é o Poder Legislativo. Nós, magistrados, não fomos eleitos. Não temos legitimidade para consagrar pela via judicial algo que deve ser consagrado pela via legislativa e assumirem a responsabilidade histórica por essa iniciativa.”

Assim, seguiu o relator em toda a sua fundamentação.

Direitos fundamentais

Após, os ministros Delaíde Alves Miranda e Hugo Carlos também seguiram o relator. Ministro Hugo asseverou:

É certo que devemos observar os ordenamentos frutos da negociação coletiva, o que não se pode admitir é que sejam flexibilizados os direitos fundamentais previstos no artigo 7º [da Constituição] e, como o caso, em que nenhuma contrapartida foi oferecida para estabelecer a natureza indenizatória da parcela.”

Por sua vez, o ministro Alexandre Belmonte considerou que a cláusula analisada no caso concreto está em dissonância com o entendimento do Supremo e a jurisprudência do TST por não assegurar nenhuma vantagem em contrapartida à supressão do direito. Convergiu com o voto do ministro Dalazen (fundamentos 1 e 3), com acréscimo de fundamentos.

Também seguiu o relator pela invalidade do acordo o ministro Claudio Brandão, segundo quem a “carta de alforria” só pode ser exercitada a partir da premissa do artigo 7º da CF, de melhoria da condição social. “Os dois precedentes [do STF] não autorizaram que qualquer norma coletiva possa alterar todo o arcabouço protetivo. Há clara afirmação na direção do reconhecimento como premissa de validade da negociação coletiva a fixação de vantagens, contrapartidas, melhoria.” E, assim, seguiu o relator apenas com ressalva quanto à segunda fundamentação.

Em seguida, foi a vez do ministro Douglas Rodrigues, que seguiu o voto do ministro Delazen, por concluir que a negociação coletiva não cumpriu sua função no caso concreto, de ampliação dos direitos sociais. “Se está dito que não houve concessões recíprocas, mas apenas supressão de horas de percurso, a negociação coletiva, fora de situação de crise, não é válida.” Contudo, fez a ressalva quanto à necessidade do TST “repensar a jurisprudência”, principalmente considerando os recentes precedentes do Supremo. “Se não avançarmos com alguma cautela, seremos atropelados por essa linha jurisprudencial que o Supremo parece abraçar.”

A ministra Maria Mallmann acompanhou todos os fundamentos do relator. O ministro Márcio Amaro seguiu o relator quanto ao fundamento de nº 2, por concluir não ser possível “retirar essa natureza salarial por negociação coletiva” das horas in itinere.

Negociado x legislado

Assentando que não advoga pela tese da prevalência do negociado sobre o legislado, o ministro Barros Levenhagen concluiu que se a CLT “permite que se delibere sobre a natureza da remuneração”: “não vejo como não poderia no caso concreto estabelecer em negociação coletiva que esse tempo de transporte fosse considerado como indenizatório. Não estamos fugindo da CLT que diz que não é salário. A CLT já diz que a utilidade transporte não tem natureza salarial”. E, assim, acompanhou a divergência do ministro Ives.

Próximo a votar, o ministro João Batista Brito Pereira seguiu o relator considerando o fundamento seis, considerando que o TRT assentou que inexiste vantagem compensatória no acordo coletivo.

Últimos votos

Após breve intervalo, proferiram os seguintes votos: Renato Paiva e Emanuel Pereira com o voto do ministro Dalazen; Lelio Côrrea e Aloysio da Veiga com o relator.

Em voto um pouco mais extenso que os que o precederam, o ministro Mello Filho foi taxativo ao seguir o voto do relator, ao considerar dispositivos da CF: “não vislumbro possibilidade genérica de flexibilização de jornada. E hora in itinere é hora de trabalho efetivo”.

Em seguida, foi a vez do ministro Alberto Bresciani, que acompanhou o relator com exceção ao fundamento de nº 5. Para o ministro, mesmo que houvesse a contrapartida, a alteração da natureza jurídica das horas in itinere viola a CLT e alcança inclusive reflexos previdenciários e outros.

A próxima na linha de votação, a ministra Maria de Assis seguiu o voto do ministro Dalazen, acompanhando o voto para negar provimento ao recurso, com base nos fundamentos de nº 1 e de nº 3.

A ministra Dora Maria acompanhou a divergência por concluir que a legislação permite fixar a natureza indenizatória das horas in itinere.

Mais um voto, do ministro Caputo Bastos, com o ministro Dalazen. Também foi o voto do Oliveira da Costa, que considerou válidos os fundamentos de nº 1, 3 e 6. Mais um voto com todos os fundamentos do relator foi o do ministro Maurício Godinho, para quem o precedente do STF fixado em repetitivo não tem abrangência para alcançar as horas itinerantes.

O último voto foi o da ministra Kátia Arruda, também com o relator, ministro Augusto, pelos seis fundamentos, destacando a diferenciação do caso em análise com os precedentes do STF.

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