04 de novembro de 2025

RN perdeu 21% da energia renovável por cortes na geração em 2025, aponta ONS


Apesar do bem-sucedido leilão para novas linhas de transmissão de energia, que deve trazer mais de R$ 805 milhões em investimentos para o Rio Grande do Norte, os cortes na geração de energia renovável seguem crescendo no estado. Entre janeiro e setembro de 2025, um total de 6.897 GWh de energia eólica e solar sofreu curtailment — termo técnico para o corte na geração — representando 21,6% de toda a produção elétrica potiguar no ano, de acordo com dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) enviados ao NOVO.

O volume de energia perdida apresenta uma forte escalada desde 2021, quando foram registrados 12 GWh, ou desperdício de 0,2% da energia renovável disponível. O número subiu para 46 GWh em 2022, mantendo o patamar de 0,2%. O crescimento se acentuou em 2023, com 1.848 GWh (6,1%), e continuou em 2024, ao atingir 5.577 GWh (15,2%). Em 2025, até setembro, o registro é de 6.897 GWh.

Segundo o ONS, as restrições ocorrem por dois motivos principais: elétricos, devido ao esgotamento da capacidade da rede de transmissão, e energéticos, causados pelo excesso de oferta em relação à demanda. Entre 2022 e 2025, os problemas elétricos foram responsáveis por 65,1% dos cortes no Rio Grande do Norte. Nos primeiros nove meses de 2025, essa proporção foi de 52,7%.

O ONS informou que colabora com o Ministério de Minas e Energia (MME), a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) para aprimorar o marco regulatório do setor elétrico. Entre as ações previstas, está a implementação de sistemas de armazenamento em baterias, capazes de absorver o excedente de geração para uso em períodos de maior demanda. A estratégia também contempla o fortalecimento contínuo da infraestrutura de transmissão e a gestão da incorporação de novas cargas eletrointensivas, como os data centers, que representam uma demanda crescente para o Sistema Interligado Nacional (SIN).

Hoje, o RN é um dos líderes nacionais em geração de energia eólica do país, respondendo por 32% da produção nacional. O estado conta com 412 empreendimentos em operação de energia (eólica e solar), totalizando 12,2 GW de potência outorgada.

Procurado pelo NOVO, o MME informou que o Grupo de Trabalho do Curtailment, criado em março deste ano no âmbito do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), segue atuando de forma estruturada para garantir a segurança e estabilidade do sistema elétrico brasileiro. “Reforçamos que, entre as medidas já encaminhadas, estão a elaboração de diagnósticos técnicos sobre a natureza e a magnitude dos cortes, a proposição de soluções regulatórias e operacionais, além da priorização de obras de transmissão e da instalação de equipamentos que aumentem a confiabilidade da rede”, detalhou o Ministério, em nota.

Na avaliação de Darlan Santos, presidente do Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia (CERNE), os cortes na geração de energia renovável no Rio Grande do Norte são um reflexo de um problema de ordem estrutural, política e regulatória. Segundo ele, a expansão da geração distribuída não foi acompanhada da infraestrutura necessária, impactando a operação do sistema. Ele aponta que a infraestrutura, que já era escassa para a geração centralizada, ficou ainda mais sobrecarregada com o crescimento da geração distribuída. Darlan ressaltou que havia dados para prever essa expansão, mas os impactos no sistema de transmissão não foram considerados.

Como solução, Darlan Santos sugere que a região Nordeste deve passar de um polo gerador para também ser um consumidor intensivo de energia renovável, atraindo cadeias de valor com impacto econômico regional, conceito conhecido como powershoring.

Ele alerta que a situação atual pode inviabilizar projetos, devido à incerteza sobre a viabilidade econômica e à insegurança jurídica e regulatória. “O risco não é exclusivo ao Rio Grande do Norte, mas principalmente à região Nordeste, que viu forte ciclo de investimentos nos últimos anos, com impactos positivos, e hoje vê uma forte retração do setor, com impacto em toda a cadeia renovável”, encerrou.

Leilão de linhas de transmissão

Os resultados do Leilão de Transmissão 4/2025 da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), do último dia 31 de outubro, confirmaram aporte total estimado em R$ 5,53 bilhões para obras de linhas e subestações em 12 estados brasileiros. No Rio Grande do Norte, o investimento previsto ultrapassa R$ 805 milhões, com geração estimada de 2.299 empregos diretos e indiretos.

O chairman do CERNE, Jean Paul Prates, destacou que o certame traz um alívio necessário aos geradores de energia renovável, mas reforçou que a medida é tardia frente à gravidade da situação.
“Apesar de ainda considerar que esse leilão demorou demais para ser organizado e anunciado, é evidente que ele poderá trazer alívio à situação crítica em que se encontram os geradores de energia renovável, principalmente na nossa região”, afirmou Jean Paul Prates.

O leilão é visto como um passo essencial para mitigar o curtailment — os cortes obrigatórios na geração de energia renovável por falta de capacidade de escoamento. No Nordeste, o problema tem se intensificado, levando ao desperdício de energia limpa e à perda de competitividade de parques eólicos e solares.

As obras abrangem a construção e modernização de 1.081 km de linhas de transmissão, além da instalação de subestações com cerca de 2.000 MW de capacidade de transformação.

No Rio Grande do Norte, a Axia Energia (antiga Eletrobras CGT Eletrosul) arrematou o Lote 7, que contempla a implantação de dois empreendimentos estratégicos: a Subestação 500 kV Açu III, com compensações síncronas de 2 × (-200/+300) Mvar, e a Subestação 500 kV João Câmara III, com compensação síncrona de 1 × (-200/+300) Mvar.

O Lote 7 foi dividido em dois sublotes, sendo o 7A com oferta vencedora de R$ 48,2 milhões, um deságio de 44,81% sobre a Receita Anual Permitida (RAP) prevista de R$ 87,3 milhões e investimento estimado em R$ 536,5 milhões; já o Lote 7B teve oferta vencedora de R$ 23,7 milhões, deságio de 45,79% sobre a RAP prevista de R$ 43,7 milhões, e investimento previsto de R$ 268,5 milhões.

Os empreendimentos contribuirão para o aumento da capacidade de transmissão no estado, com implantação de compensadores síncronos e reforço da estabilidade elétrica. As obras devem ser concluídas em até 42 meses.

Para o presidente do CERNE, Darlan Santos, a expansão da transmissão precisa ser acompanhada por uma estratégia integrada que una geração e consumo local, ampliando o aproveitamento da energia limpa e fortalecendo a economia regional.

Segundo o CERNE, a ampliação da rede de transmissão cria as condições necessárias para consolidar o Nordeste como polo de industrialização verde, atraindo segmentos como data centers, hidrogênio verde e metalurgia de baixo carbono, e integrando o potencial energético da região à nova economia de baixo carbono.

Jean Paul Prates destacou a importância de um olhar estruturante sobre o futuro do setor elétrico e alertou para a urgência de medidas que garantam previsibilidade e segurança jurídica aos empreendedores.

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